Site Autárquico de Alcoutim

Património Cultural Imaterial e Memórias
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Vinho

A cultura da vinha é muito representativa da tradição agrária mediterrânea, embora ela tenha vindo da Ásia. Em torno do Mediterrâneo encontrou condições climáticas e de solos excelentes para proliferar. Aos Gregos e aos Romanos devemos o aperfeiçoamento das técnicas tradicionais de produção de vinho. No concelho de Alcoutim têm-se mantido uma tradição milenar de produção de vinho, conhecido por vinho caseiro. Junto ao Guadiana ou em parcelas de terreno argilosas com boa exposição solar, é presença habitual a existência de pequenas vinhas. Por tradição, a maioria das famílias tinha uma pequena vinha ou pés de vinha isolados, em hortas e forjais, que davam uvas para o consumo direto ou para serem espremidas à mão ou com os pés, dependendo da quantidade e das instalações. O mosto era colocado em barris de madeira onde ficava em repouso a fermentar durante algumas semanas até o vinho estar pronto para consumo. O vinho, a par do azeite e do pão são os produtos mais representativos da economia rural mediterrânea. Eram bens muito valorizados e que as famílias procuravam ter produção para consumo próprio e alguns excedentes para comercializar. Atualmente a produção de vinho é muito reduzida, embora o concelho apresente boas condições edafoclimáticas para a sua produção.

 

Medronho

O medronho, baga redonda e verrugosa, de cor avermelhada é fruto do medronheiro. O fruto colhe-se entre outubro e dezembro, quando a cor fica vermelha. Tradicionalmente o medronheiro não era cultivado na região, surgindo como “arbustiva espontânea”, sobretudo, na freguesia de Vaqueiros, onde encontra as melhores condições edafoclimáticas. Nas últimas décadas, alguns agricultores da região têm apostado na plantação e cultivo de medronheiros de uma forma mais ordenada. Esta planta é adequada para rentabilizar solos florestais, com menor aptidão agrícola. O medronho, para além de poder ser consumido como fruta, é utilizado principalmente na produção de aguardente. A aguardente de medronho é um produto muito apreciado e valorizado na região. O seu processo de fabrico respeita técnicas e processos ancestrais de maturação, fermentação e destilação em alambique de cobre aquecido a fogo lente de lenha. O fruto também pode ser utilizado na confeção de licores, vinagres, doces e compotas.

 

Ervas aromáticas e silvestres

A riquíssima flora da região desde sempre foi utilizada pela população como complemento alimentar e na medicina popular. As gentes do mundo rural detêm conhecimentos empíricos que lhe permite identificar cada planta e conhecer as suas propriedades e formas de as utilizar. A grande maioria destas aromáticas nasce e cresce de forma espontânea, mas muitas delas é possível transplantar para a horta. Normalmente a sua apanha e produção é para consumo doméstico existindo pouco comércio deste produto na região. Entre as várias plantas temos o poejo, planta aromática da família das mentas, muito fresca e que cresce espontaneamente, principalmente junto às linhas de água. É utilizada no Baixo Guadiana, essencialmente, para as açordas, caldeiradas de peixe do rio e enguias. Também é usada como planta medicinal sob a forma de chá. Orégãos é outra aromática imprescindível para temperar saladas e fazer a conserva das azeitonas. O loureiro, também utilizado como condimento na culinária. O alecrim, partilhando os campos com a esteva e o rosmaninho, pode ser utilizado para grelhados de carne e peixe, bem como perfumar os cozinhados de legumes. O alho areio, em muito semelhante ao alho francês, surge em terrenos arenosos, embora seja difícil de encontrar. A hortelã da ribeira, que se desenvolve junto das linhas de água, é muito utilizado no tempero de caldeiradas de peixe do rio. O montraste, planta semelhante à hortelã, está associada às decorações das festas dos Santos Populares e é também aplicada em chás digestivos. A erva-ursa, uma variedade de tomilho, é utilizada em chás para problemas de estômago e tosse convulsa. O funcho, para além dos chás com propriedades medicinais, é aplicado para aromatizar os figos secos, as aguardentes e as azeitonas.

Engorda do “Sovão” – enchidos

Na região de Alcoutim engordar um porco ou dois num pocilgo perto de casa para matar na época do natal é uma tradição muito enraizada. Chama-se a esse animal ou animais “Sovão”. O pocilgo também era património obrigatório nas famílias desta região, que praticavam uma agricultura de subsistência com o objetivo do autossustento. O animal era alimentado durante meses com farelos, cereais e restos de legumes e frutos que resultavam dos desperdícios domésticos. Chegando a época do natal, o animal, era abatido seguindo um “ritual” quase festivo em que era amanhado e tudo religiosamente aproveitado. Eram conhecimentos empíricos de sustentabilidade. As tripas eram lavadas e amanhadas, de forma a receber, daí a poucos dias, a carne picada e temperada, que seguia para o fumeiro dando origem às famosas “chouriças” e “paios” tradicionais. As patas traseiras do animal eram talhadas e preparadas para irem para a “salgadeira” onde ficavam algum tempo metidas em sal, antes de irem para o fumeiro onde acabavam de curar dando origem a saborosos presuntos. Atualmente a tradição ainda se vai cumprindo e há já explorações que mantendo e usando as técnicas tradicionais, produzem para comercializar.

 

Pomar de sequeiro – amêndoa – alfarroba – figo seco

O Algarve é também sinónimo de frutos secos, sobretudo a serra e o barrocal, são por excelência as zonas produtoras. O clima ameno é propício ao cultivo de árvores de sequeiro e figueiras, produzindo figos, amêndoas e alfarrobas de grande qualidade. Estes frutos que já tiveram um importante lugar na economia regional e na alimentação de pessoas e animais, podem ser degustados de variadíssimas formas, a solo ou em harmonia com outras iguarias. A tradição da produção dos frutos secos faz parte da história algarvia, e os vários ciclos de produção, tradicionalmente feitos à mão, representavam grande parte das atividades das gentes, desde a apanha, o partir dos frutos, até à secagem e transformação. A sua exploração tradicional destaca-se na dieta mediterrânica aqui praticada. Apesar de ainda se manterem alguns processos artesanais, a produção industrial ganhou terreno e esta continua a ser uma importante atividade socioeconómica da região.

Amêndoa - A amendoeira é uma árvore de folha caduca e a semente do seu fruto é a amêndoa, um fruto seco. As amêndoas podem classificar-se em três grandes grupos: as cocas, cuja casca é extremamente mole, as molares, que oferecem pouca resistência e as durázias, que custam a partir. O miolo é mais ou menos doce ou então amargo e utilizado sobretudo na doçaria tradicional. A amendoeira é originária das regiões quentes e áridas do Oeste da Ásia, sendo levada, provavelmente, para a Grécia e Norte da África durante a época pré-histórica. Atualmente a amêndoa é cultivada na maior parte dos países banhados pelo Mar Mediterrâneo e também na Califórnia (EUA). É uma árvore que não necessita de muitos cuidados e que nunca atinge grande porte. Depois de adulta, uma limpeza e lavoura de tempos a tempos chegam-lhe. A apanha faz-se de meados de agosto a meados de setembro, dependendo das condições climatéricas do ano e da mão-de-obra. Após a pelagem, põem-se ao sol um ou dois dias, e a seguir são ensacadas. Pesadas ainda muitas vezes com balanças romanas, são vendidas às arrobas aos intermediários das redondezas. Também é possível adquirir a amêndoa e seus subprodutos em feiras e mercados locais, feiras de artesanato e estabelecimentos comerciais, nomeadamente supermercados locais, pastelarias, entre outros.

Alfarroba - A alfarrobeira é uma árvore de folha perene, originária da região mediterrânica que atinge cerca de 10 a 20 m de altura, cujo fruto é a alfarroba. A raridade da alfarrobeira à escala planetária prende-se com as exigências climatéricas desta árvore, conhecida desde eras remotas. Ela gosta de climas secos e suaves e não aguenta geadas. No contexto nacional ela ganha protagonismo no barrocal e na serra algarvia. A alfarrobeira é pouco exigente em termos de cultura agrícola, tem um crescimento moroso e multiplica-se por sementes e por enxertia. O seu fruto, a alfarroba, é apanhado no mês de agosto. A floração que dará origem à produção do ano seguinte ocorre ao mesmo tempo que os frutos ficam maduros. Tradicionalmente utilizada como alimento para animais, a alfarroba tem conhecido um novo impulso e novas utilizações: desde licores a bolos, bolachas e tartes, passando pelo gelado e fabrico de chocolate. Inclusive o óleo extraído das sementes da alfarrobeira tem sido utilizado na indústria cosmética. Da alfarroba tudo pode ser aproveitado, embora a sua excelência esteja ainda ligada à semente, da qual é extraída a goma, constituída por hidratos de carbono complexos (galactomananos). Para além das já mencionadas, tem tido também aplicações nas indústrias da farmacêutica, têxtil e do papel.

Figo - O figo é o fruto da figueira, árvore de origem mediterrânica, cujo consumo se iniciou na pré-história. Os seus frutos são de estruturação carnuda e suculenta e apresentam uma coloração branco-amarelada que vai até roxa. Trata-se de um fruto altamente energético, rico em açúcar, fibra, ácidos orgânicos e sais minerais como o potássio, o cálcio e o fósforo. Pode ser consumido em fresco ou em seco. A pele é tenra, contém poucas sementes e a sua maturação é longa. Os figos de secar têm uma pele mais dura e compacta e amadurecem mais rapidamente. A secagem dos figos, embora simples, requer alguns cuidados básicos, tal como um local ao ar livre protegido da chuva e da humidade (tradicionalmente em esteiras nas açoteias ou nas eiras, secados ao sol) e frutos escolhidos, bem maduros e de casca intacta. Os figos secos, em regra preparados de forma artesanal, são geralmente vendidos nas feiras e mercados. Geralmente são conservados em cestos de cana, com funcho, erva doce, tomilho, entre outras plantas, bem acamados para que não se estraguem. Outros são torrados, com ou sem recheio de amêndoa. O figo também é um ingrediente indispensável na doçaria algarvia. O «figo cheio», o «queijo de figo» ou o «morgado de figo» são apenas alguns exemplos de como este fruto pode ser utilizado. É também muito frequente a sua aplicação em «estrelas de figo e amêndoa», bolos, doces, licores, aguardente e também a «conserva de figos».

 

Olivicultura – azeitonas – azeite

A azeitona é o fruto da oliveira, árvore da bacia do mediterrâneo conhecida há milhares de anos. São árvores de porte médio que habitualmente vivem séculos e têm grande capacidade regenerativa. A sua multiplicação faz-se por enxertia e por estaca, adaptando-se bem aos solos magros e xistosos da serra algarvia. Contudo a sua produção é bastante condicionada às condições climatéricas e ao local onde se localiza. Para aumentar a sua produção os alcoutenejos plantavam-nas junto às linhas de água, em várzeas ou onde houvesse melhor terra. A sua rentabilidade também deriva de podas anuais, de cavas em redor do pé e adubação com estrume de animais. As azeitonas têm várias colorações do verde aos tons acinzentados, dourado, castanho-claro, roxo ou preto. Quanto mais escuro, mais tempo o fruto madurou. Cerca de 25% da sua composição é azeite de oliva, sendo rico em ácidos gordos benéficos para incrementar os níveis do "bom colesterol". O azeite é um dos três alimentos básicos da dieta mediterrânica. Os Gregos e os Romanos, verdadeiros apreciadores e produtores de azeite, eram pródigos a descobrir-lhe aplicações. Para além do uso culinário, utilizavam azeite como medicamento, unguento, bálsamo ou perfume, combustível para iluminação e impermeabilizante de tecidos. A oliveira e o azeite ocupam uma posição privilegiada na cultura do mundo rural e no concelho de Alcoutim. No baixo Guadiana a colheita das azeitonas é aproveitada para a “conserva” e para a produção de azeite. À mesa, a azeitona, marca sempre presença “britadas”, “retalhadas”, “conservadas no sal” ou “doces em água”, bem como o azeite é tempero indispensável.

 

Produção de trigo – pão

O pão em conjunto com o azeite e o vinho, constituem a trilogia sagrada da dieta mediterrânica. Estes três ingredientes são ainda hoje imprescindíveis na mesa de um serrenho. O pão destaca-se no património gastronómico português, acompanhando quase todas as receitas tradicionais do sul do país, assumindo mesmo o papel principal nas açordas, nas migas e nos gaspachos. O pão, tradicional desta região serrana, é preparado com farinha de trigo, fermento, sal e água que baste para amassar. Pesa entre 800 gr e 1,5 kg e é um pão de testa (mais levantado numa das extremidades, assemelhando-se a uma dobra) e tem côdea rija, castanha clara e miolo esbranquiçado, cozido em fornos aquecidos a lenha. Com um sabor divinal e uma textura única pode servir como uma entrada, compor uma refeição ou até uma sobremesa, como as apetitosas «fatias douradas». A ocupação árabe desenvolveu a agricultura na região e intensificou o cultivo dos cereais e o consumo de pão que também permitiu o aumento considerável da população e do número de locais habitados. Desde essa época o cultivo do trigo ganhou grande importância na atividade agrícola da região. A sua produção representa um ciclo agrário desde a lavra da terra, o lançar a semente, à monda, ceifa, debulha, moagem, que acompanha e é condicionado pelo clima, iniciando-se em outubro e terminando em maio. Depois do grão de trigo armazenado era necessário recorrer aos moinhos para a transformação em farinha que, em doses semanais ou quinzenais, era peneirada, amassada, tendida e cozida em forno a lenha até o pão chegar à mesa. Atualmente o fabrico do pão industrializou-se e no concelho de Alcoutim existem várias panificadoras que fazem questão de manter as principais características tradicionais do pão caseiro granjeando fama e prestígio junto dos consumidores dos centros urbanos do litoral.

 

 

Doçaria

A doçaria alcouteneja é afamada na região há séculos, e nela se destacam o bolo de massa de pão, o nogado, as filhós, os folares, as azevias, os suspiros, as pupias e as costas.

Os fornos de lenha, existentes em todos os montes do município, atestam a qualidade do pão desta região, que poderá encontrar à mesa dos restaurantes locais, das mercearias e minimercados e das unidades de fabrico existentes na freguesia de Martim Longo (aldeia de Martim Longo e Pessegueiro) e Vaqueiros (Alcarias).

O visitante poderá ainda encontrar na fábrica de enchidos de porco preto no monte do Zambujal (freguesia de vaqueiros), os tradicionais chouriços, presuntos, torresmos, etc.

Outras ocasiões especiais para provar a Gastronomia local são a Feira do Pão Quente e Queijo Fresco em Vaqueiros (2º domingo de março), o Festival do Contrabando (final de março) a Feira dos Doces d’ Avó em Alcoutim (sexta feira e sábado de Páscoa), a Feira de Artesanato em Alcoutim (fim de semana mais próximo de 10 junho- cada 2 anos) e a Feira da Perdiz em Martim Longo (todos os anos 2º fim de semana do mês de novembro).

Da vila de Alcoutim até os locais mais recônditos da serra do caldeirão, poderá selecionar um dos vários restaurantes do concelho e provar alguma das iguarias que as nossas gentes têm para dar a provar.

 

Gastronomia

O visitante que queira conhecer bem Alcoutim terá de reservar um tempo da sua estadia ou passagem pelo município para descobrir e saborear a riqueza gastronómica da região. A proximidade do rio Guadiana, a riqueza cinegética e a agricultura, praticadas no concelho refletem-se na cozinha local, bastante simples e sóbria, mas rica e equilibrada. Os pilares da alimentação no concelho são sobretudo a carne de porco, o pão e o azeite. Dos pratos que a Serra tem para oferecer destacam-se as migas, cozidos, sopas, açordas, gaspacho e ensopados, e em época de caça também se podem degustar pratos de javali, perdiz, coelho, lebre e veado. Nas zonas mais próximas do rio Guadiana, o peixe também faz parte da gastronomia local, nomeadamente a lampreia, a enguia, o barbo o muge e a saboga.

Estas bases são complementadas pelos produtos da horta. Grãos, feijões, favas e ervilhas são igualmente muito utilizados assim como as plantas e ervas aromáticas (orégãos, poejos, coentros, salsa, hortelã).

 

Caça

A caça, praticada na região desde tempos imemoriais, de raposas, javalis, coelhos, lebres, rolas e perdizes atraí caçadores de todas as partes e justifica a criação de coutadas de caça. Alcoutim é um concelho com uma grande apetência para a atividade cinegética, possuindo quase metade das zonas de caça turísticas existentes no Algarve. A caça, neste território, representa atualmente uma importante fonte de emprego direto e indireto, assim como uma considerável entrada de receitas.

Desde os tempos primitivos que a caça constitui uma das atividades de sobrevivência do ser humano. O instinto de caçar está presente no homem, seja na sua forma original, na prática de desporto ou na tradição de uma região. A caça representa, desde o Paleolítico, uma contribuição em carne muito importante para o regime alimentar das gentes da Serra, uma vez que os animais domésticos (à parte do porco) eram reservados para outros fins.

 

Pastorícia

A pastorícia tem uma longa tradição no concelho de Alcoutim e é das atividades rurais mais rentáveis da região. O gado aqui criado é sobretudo ovelhas na parte mais norte do território e cabras na área mais serrana a sul. Desta exploração os criadores retiram leite, que é transformado em queijos, animais juvenis destinados ao abate e consumo de carne, e a lã de ovelha destinada à produção têxtil. Existe, contudo, uma raça caprina característica desta região designada por “raça algarvia”. É uma raça com algumas características específicas e perfeitamente adaptada às zonas pobres da serra algarvia. Das suas características destaca-se a sua aptidão leiteira. É explorada em regime extensivo aproveitando o prado natural com suplementação feita em épocas de carência e de lactação. Os rebanhos são sempre acompanhados pelo pastor que tem de percorrer grandes distâncias e regressam todas as noites ao curral. São animais corpulentos de pêlo curto, de cor branca, com malhas castanhas de várias tonalidades, pretas ou, mais raramente pretas e castanhas.

 

Tecelagem

A prática da tecelagem era um imperativo, uma necessidade das populações agrárias autossustentáveis, com grande tradição na serra algarvia. Fragmentos de pesos de tear, encontrados no povoado calcolítico do Cerro do Castelo de Santa Justa, documentam o exercício da tecelagem neste território há mais de 4000 mil anos. A lã de ovelha, as tiras de trapos (tiras em tecido reutilizáveis) e o linho, uma fibra vegetal aqui cultivada, eram a matéria prima utilizada na confeção de mantas, tapetes, alforges, colchas, naperons panos grosseiros, etc. Normalmente eram as mulheres que se dedicavam a esta atividade e que se encarregavam de ensinar as filhas ou netas, passando o conhecimento de geração em geração. Os teares eram instrumentos, fabricados em madeira, com uma tecnologia tradicional complexa, que permitiam produzir tecidos através do cruzamento de fios, designados urdidura e trama, construindo uma teia. À propriedade de um tear, por tradição herdado, era dado grande valor, constituindo este facto elemento revelador da grande importância que tinha a tecelagem artesanal no concelho de Alcoutim, onde existiram centenas de tecedeiras. Esta arte, além de produzir os bens necessários para uso da família, era encarada também como um ganha pão, pois muitas tecedeiras faziam produtos por encomenda e vendiam nas feiras da região. Atualmente ainda existem muitos teares em condições de poderem trabalhar, mas apenas duas tecedeiras vão fazendo alguns trabalhos esporadicamente.

 

 

Apicultura

A existência de enxames de abelhas, na natureza, desde há milhares de anos levou o homem pré-histórico, caçador-recoletor, a coletar favos de mel e com os anos a tentar domesticar estes insetos. Porém esse processo de domesticação ainda não foi conseguido até aos dias de hoje. Contudo o homem desenvolveu técnicas e equipamentos capazes de explorar as abelhas. Na natureza os enxames podem alojar-se em buracos nos troncos de árvores ou em grutas e cavidades rochosas. O homem começou a fabricar colmeias em barro, em fibras vegetais, cortiça, etc… No concelho de Alcoutim, onde a população maioritariamente praticou a agricultura, de onde retirava o sustento familiar, a pastorícia e todas as atividades complementares, não deixou de se dedicar à apicultura. Os enxames eram colocados dentro de cortiços e estes agrupados em locais abrigados dos ventos norte, com boa exposição solar virada entre o nascer e o pôr do sol. A estes locais o alcoutenejo chamava “colmeal” ou “malhada de abelhas”. Era comum localizá-las perto de hortas ou nos arrifes (designação de locais com afloramentos rochosos à superfície, geralmente com mato). Na primavera, quando o cortiço estivesse cheio, as abelhas eram obrigadas, com o auxílio de fumo, a passarem para um cortiço vazio e o apicultor trazia para casa o cortiço cheio. O transporte era feito no dorso do burro ou muar de carga. Chegado a casa procedia-se à retirada dos favos do interior do cortiço, que de seguida eram exprimidos à mão para dentro de um alguidar de barro e posteriormente armazenados em potes de barro ou frascos de vidro. As bolas de cera eram depois escaldadas e com a água que resultava dessa “lavagem” era feita a água mel, uma iguaria típica das terras do sul. Era uma prática que pretendia apenas obter mel para o consumo familiar havendo um ou outro apicultor que pudesse vender aos vizinhos que não tivessem produção. Atualmente é uma atividade em expansão, atraindo jovens produtores com o objetivo da profissionalização.

 

Pesca

A pesca no rio Guadiana, na região de Alcoutim, remonta pelo menos à pré-história recente com a humanização deste território. Constitui-se por uma atividade artesanal que detém várias técnicas, artes e saberes transmitidos entre pais e filhos ao longo de gerações. O seu desenvolvimento, tal como outras atividades tradicionais, deveu-se à necessidade de sobrevivência das comunidades ribeirinhas que souberam aproveitar os peixes do rio, como recurso natural, para a sua alimentação. Com o passar do tempo formaram-se comunidades piscatórias especializadas que comercializavam o pescado por outros produtos que não tinham. As artes tradicionais foram utilizadas durante séculos quase sem sofrerem alterações significativas. Na região de Alcoutim as artes mais utilizadas são os tresmalhos, os aparelhos de anzol e as nassas. Nas últimas décadas, devido sobretudo à legislação imposta, deixaram de ser utilizadas as tarrafas, fisga, colher, tapa esteiros e redisca.

As espécies pescadas são sobretudo a enguia, a lampreia, a tainha, o barbo, a saboga, a boga e o sável. Em épocas de estio também se pescam robalos e corvinas, espécies marinhas que sobem o rio até Alcoutim onde a água no verão fica muito salgada. O esturjão foi uma importante espécie aqui pescada e que desapareceu do Guadiana à medida que as águas ficaram poluídas. As embarcações tradicionais utilizadas neste território foram a “pateira” ou “bateira”, a “chata”, o “bote” e a “lancha” que se deslocavam pela força dos remos. Estas embarcações de madeira eram fabricadas localmente. Na maioria das povoações ribeirinhas existiam carpinteiros navais que fabricavam e restauravam este tipo de barcos. Muitas vezes eram os próprios pescadores que acumulavam estas competências. Nas últimas décadas estas embarcações tradicionais foram dando lugar a modernas embarcações em fibra e nas poucas que se mantêm foram adaptados motores.

Atualmente a pesca tradicional no Guadiana corre sérios riscos de desaparecer. Os pescadores ainda no ativo são em número muito reduzido e com idades avançadas. Concorrem para o estado atual desta atividade, que marcou culturalmente as populações da margem do rio, a forte diminuição de peixes devido à poluição crescente das águas do rio, as restrições legislativas que proibiram inúmeras artes de pesca e colocaram restrições na utilização de outras. Todos estes fatores tornaram a atividade pouco, ou nada, lucrativa levando ao desinteresse das gerações mais jovens e tornando-a uma atividade complementar para os mais velhos.

 

Cestaria

A cestaria é a arte de entrançar fibras naturais e conferir-lhe uma forma, produzindo, assim, recipientes utilitários para o transporte ou armazenamento de produtos agrícolas. Pelo que é de grande utilidade e uso generalizado em comunidades rurais como a de Alcoutim. Nesta região a cestaria especializou-se na produção de cestos e canastras, em ripas de cana. Os abundantes e extenso canaviais, nas margens do Guadiana e ribeiras da região forneciam a matéria prima indispensável aos “Mestres” cesteiros. Além da cana também o vime era utilizado. Por vezes eram fabricadas peças com os dois tipos de fibras, por exemplo costuras e fruteiras. Na pesca, os cestos eram o recipiente de eleição para o transporte do pescado, mas era nas atividades agrícolas onde a cestaria era mais necessária, na apanha de figos, bolotas, alfarrobas, azeitonas, etc. O surgimento generalizado dos recipientes de plástico veio praticamente terminar com esta atividade, que ainda subsiste de forma muito residual. No concelho apenas dois homens ainda se dedicam a esta arte.